Por António Loureiro, antropólogo in " O Setubalense " de 22-10-2008
Para quem gosta de Setúbal em geral e da organização do espaço urbano em particular, não fica indiferente às alterações morfológicas, espaciais e funcionais que aconteceram no Largo José Afonso e estão agora a decorrer na avenida Luísa Todi, resultando em descontentamento:
a) – A deslocalização da Feira centenária para as Manteigadas foi um erro espacial e político, contribuindo para o empobrecimento do que resta do pouco e híbrido património cultural que a cidade tem.
A Feira mudou de lugar ao longo do tempo, é certo, mas ficou sempre junto à malha histórica e urbana da cidade. Manteigadas não tem história, nem identidade, nem condições ecológico-morfológicas para a Feira de S’antiago.
Mais tarde ou mais cedo, alguém que goste da cidade terá que corrigir esta maldade.
b) – O Pórtico-teatral no Largo José Afonso é um delirium arquitectónico e uma ofensa à identidade daquele espaço e da arquitectura urbana ali existentes, quer em termos de desenho, quer em termos de cércia, pelo que estou totalmente de acordo com o texto de Giovanni Licciardello, publicado nesse jornal.
c) A avenida Luísa Todi tem sofrido alterações ao longo do tempo, como documenta o álbum fotográfico de Américo Ribeiro.
Admito que a avenida Luísa Todi precisasse de intervenções pontuais, mas nunca o que se está a fazer e o resultado já é visível:
As passadeiras agora feitas ora são “lisas” ora são em lomba, desvirtuando a morfologia plana da avenida. A falta de regularidade no pavimento contribuirá para a “desorientação” espacial dos automobilistas e provocará acidentes nas passadeiras “lisas”, quase invisíveis.
- O topo poente da avenida “virou” parque de estacionamento (quando era área verde abandonada, por desmazelo municipal), mas pelos vistos do agrado do leitor Pedro Cascais que no jornal «O Setubalense» referiu que (…) no futuro posso deixar o carro estacionado quase em frente ao bar que frequento”.
Para Pedro Cascais pouco importa o mal que a sua “pegada ecológica” faz à cidade, devendo ser dos que também gostaria de estacionar o seu automóvel no escritório, ao lado da secretária, entre o bengaleiro e a impressora.
- A nascente e a poente da Fonte dos Golfinhos, a avenida foi “dentada” na sua morfologia, com derrube de árvores, para dar lugar a dois parques de estacionamento.
- O pavimento lateral poente junto à Fonte das Ninfas, apresenta um desnível acentuado relativamente ao pavimento rodoviário, frente ao Mercado do Livramento, motivando o “afocinhamento” de automóveis mais baixos. (Quem pagará os sinistros futuros?)
- No corredor da avenida encontra-se uma ciclovia aos “esses”, que é mais uma cicloloucura digna de um prémio Nobel de (des)arquitectura.
d) – As cidades contemporâneas, com uma visão moderna, actual e de futuro, estão a devolver o espaço urbano aos cidadãos e a remeter os automóveis para o subterrâneo, ou para a periferia. Em Setúbal, o Polis com cumplicidade municipal está a fazer exactamente o contrário do que se faz de nova Iorque a Paris, ou de Barcelona a Portimão. (Exemplos de urbanismo funcional).
e) – O arquitecto Manuel Salgado é o autor do Polis de Setúbal e do Pórtico do Largo José Afonso, e não admira que faça arquitectura sem se preocupar com o espaço e a estética, como costuma referir, porque o povinho “papa tudo”.
f) – Por isso também não admira que a Câmara Municipal de Setúbal “pape” todos os “mamarrachos” que lhe vendem, sem se preocupar com a morfologia espacial e estética de uma das áreas geográficas mais emblemáticas, simbólicas, turísticas e culturais da cidade.
As cidades são demasiado importantes para ficarem apenas nas mãos de arquitectos e políticos. Os que gostam de Setúbal têm sensibilidade, educação estética, sentido histórico e cultural e não “papam tudo”, porque querem ver a cidade e o seu património ao nível do que de melhor se faz pela Europa e no Mundo.
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